o que vejo e sinto

fevereiro 14, 2008

CASA FECHADA, para MARIA

Está acontecendo na Casa de Cultura Mario Quintana em Porto Alegre, RS ( Brasil), uma exposição de artistas reunidos por seus conteúdos em um tema " A casa". Essa junção de artistas de Porto Alegre , foi feita pela também artista plástica Dione Veiga Vieira, que desde muitos anos tem a casa e corpo como conteúdo de estudo e investigação em suas obras.
O titulo da Exposição se chama : CASA FECHADA – Um Contexto em Aberto http://expocasafechada.blogspot.com/ . Bem oportuno para nossa casa de Cultura Mario Quintana. A própria exposição, em uma de suas obras confirma o fechamento desta casa, pois uma das Obras não pode ser vista , pois a Casa, não tinha condições técnicas de acolher e cuidar dela.

As obras, apresenta uma similaridade quase que orgânica. São instigantes, trazem conteúdos como a concepção da vida, o feminino/masculino, amores, reparações, medos, sonhos, angústias e até a finitude.


Dione Veiga Vieira - Nascimento de Afrodite - sobre a Origem e Criação -Instalação e Fotografia, propõem quase que sutilmente um ato de concepção em suspenso. Dione eternizou a concepção de maneira tridimensiona ( detalhe de um pendulo que é suspenso sobre um recepiente no chão ). Sobre este arranjo esta um tecido maculado por argila e sobre ele um ovo. Esta obra não precisa detalhamento, ou reflexões, basta sentir. Há conceitos masculinos e femininos em sua sugestão. Vê-se um corpo cuidadosamente acomodado e dobrado, há também nele as rugas inevitáveis do tempo. Um tecido, que desnudou um corpo; um corpo também desnudo concebendo outro corpo. Este tecido, com suas dobraduras, se apresenta também como um livro, com páginas e páginas que discorrem uma história com início meio e fim; O tempo, a casa e o corpo. Esta é Afrodite de Dione.



Fotos acima são detalhes do Nascimento de Afrodite, Fragmento ( Fotos - Jones 2008)

Os Olhos de Dionísio
Escultura de
Klinger Carvalho, as cadeiras são onde os corpos sempre são acolhidos, para acolher não necessariamente necessitam de braços, mas sim de pernas. Cadeiras sem pernas é como gato sem pelos, boneca sem braços. Klinger nos remete a um corpo que inevitavelmente necessita ser reparado em qualquer momento da vida. Impossível na obra de Klinger é não olhar aos olhos de Dionísio. Os mortais e finitos habitantes de uma casa, antes de diluirem-se em suas existências são constantes reparados ( arrumados, costurados, colados e engessados), sob os próprios olhares incrédulos de si mesmo, de que sim: se deixa de existir, e a casa pode talvez ficar olhando eternamente, e pasmem : sem piscar.

Fotos acima, são detalhes da obra Olhos de Dioníso ( Fotos Jones 2008)

Galho Fumante - Fragmento
Instalação de
Munir Klamt e Laura Cattani – (Grupo-Ío), nesta obra, o musgo , como um parasita que se instala e se vale da vida do outro, pode registrar os sentimentos que a casa comporta oriundo de seus habitantes. A casa que suga, os corpos que sugam, ou seja a existência esta relacionada com a inter depêndencia. Não se existe isolado; dentro de uma casa os corpos e espaços se fundem tornando-se quase uma coisa só . Há um detalhe na obra, que se pode observar como uma sugestão de um ninho com um ovo de pedra. A frieza da pedra, no musgo enquadrado na parede branca denuncia como podem ser os corpos em suas respectivas relações afetivas. Docilidade- frieza. Dependência- independencia.


Fotos acima , são detalhes da Obra Galho Fumante, Fragmento ( fotos Jones 2008)



O Estado Amoroso e a Melancolia – Fragmento
Instalação de Luciano Zanette e Gabriela Picoli; todas as casas trazem recantos e fragmentos de estados afetivos, que passam invisíveis, ou se percebem apenas partes. Há sempre recantos da casa mais desejados, outros menos desejados.Há espaços em uma casa que se passa uma vida toda sem ir mais de uma vez. Assim como partes de corpos, algumas são muitos evidentes, outras simplesmente não existem. Os braços presentes, sugerem a presença do afeto e a busca destes para contatos e acolhimentos. Há partes de corpos que se tornam, ou lhes tornaram invisíveis em muitas relações. Mãos e braços que acompanham a aproximação e afastamento no existir. São braços que acolhem e que também rejeitam.




Fotos acima dão detalhes, da obra O estado amoroso e melancolia - fragmento ( fotos, Jones 2008)





Maria
Vídeo de
Marcelo Gobatto , e por último MARIA, que não estava presente. Maria somente estava na festa de inauguração. Depois da Festa não foi possível ficar com Maria. Procurei Maria por todos os cantos , pois a casa também era dela e Maria não estava.
O fato da obra não conseguir ficar por dificuldades técnicas da casa, entendo que completa de maneira importante o ciclo da existência em uma casa. A morte ou ausência , e os fantasmas que habitam uma casa, estão presentes sempre. Maria, veio a festa mas não pode ficar, não porque não quis; Não puderam ficar com ela. Não havia comodo para Maria. Maria é especial talvez. A casa é pobre de muitas coisas para ter Maria. Mas Ela existe. Esta impregnada na casa a sua presença. Eu apenas li, o que tinha em Maria. Mas sei que Maria trazia o que muitas Marias trazem: memória, afeto, encantos , desencanto e finitude, a ausência inevitável e porque não a exclusão.


Assim, se mostrou A casa. Como toda casa, hora aberta, hora fechada. Habitada por memórias, objetos e corpos. Senti frestas enormes e convidativas, com rugas e feridas de um corpo que nasce, cresce e se finda. A reflexão maior na proposta da exposição e de instigante tema, é que todos tem ou tiveram uma casa. Esta casa por sua vez pode ser o seu próprio corpo, que necessita ser cuidado reparado e preparado para deixar de existir ou continuar existindo. Algumas casas existem por gerações e gerações, assim como os corpos que podem se eternizar por seus feitos ou por suas relações de afetos e memória.

As casas podem se mostrar fechadas ou abertas. Há coisas que as casas não conseguem manter, ou mesmo acolher. Ficando sempre espaços vazios e memórias pulsantes. Seja esta uma grande ou pequena casa. Há casas que tem apenas objetos, sem corpos. E há casas que guardam apenas corpos sem objetos, e que talvez jamais foram habitadas conjuntamente por corpos e almas.

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