o que vejo e sinto

janeiro 16, 2008

Verás ainda, o cinema de Vera

Com a bendita retomada, já alguns anos, de produções nacionais e regionais, temos o privilégio de apreciar belíssimas obras com conteúdos profundos e primor técnico invejável.
Há cineastas desconhecidos que produzem suas obras e são vistas por uma minoria. Sabe-se aí, que muitos interesses e outras condições são variáveis que sempre vão estar presentes e impedindo que muitas produções ingressem no circuito comercial ou em outros circuitos culturais de abrangência maior. São os fenômenos incompreendidos de mercado comercial e cultural. Isto acontece com outras manifestações artísticas, e não é diferente com o áudio visual (cinema película/digital). Verbas e verbas astronômicas para produções puramente facilitadas - no sentido de beneficiar alguns poucos, e sem a perceptiva de retorno de investimento considerando como um produto. Mas este é outro tema....
Sempre vamos ter talentos escondidos que poderão ou não serem descobertos. Lastima, quando suas obras não chegam a nós. Perdemos todos. Mas penso que a empreitada é assim mesmo, e como desafio, resta a produzir e mostrar mesmo que estas amostragem sejam restritas. Menos mal que hoje temos a internet com alguns sites que possibilitam a divulgação, amostragem e até exibição de algumas obras.
Eu me deparei com um talento já alguns anos, para mim um grande achado. E gostaria imensamente que todos pudessem ter acesso, a obra desta artista. Falo da diretora e talentosa Vera da Luz, de Porto Alegre, que vem do teatro , lá dos anos 80 (como atriz, diretora e produtora) , desembocando no Vídeo/Cinema -Digital e Diretora de Televisão ( programa Saber Mais, canal 06 da net Porto Alegre, (http://www.poatv.org.br/) e também cantora. É um talento, raro que pouco sabemos.
A obra de Vera da Luz, tem algo orgânico e intuitivo. Ela roteiriza, capta as imagens de maneira pura, como são concebida em sua criação, isto dá uma individualidade, uma tonalidade e dramaticidade incomum. Às vezes penso; se A Vera tivesse todas as condições técnicas e orçamentos , o que ela faria ? Também tenho dúvidas, acho que a pureza dos conteúdos e da carência de produção é que dão o diferencial de sua obra. Não sei se grandes orçamentos poderiam manter a fidelidade de suas criações. Os apoios e orçamentos maiores, poderiam sim, ajudar a divulgar e colocar suas obras para o acesso a todas as pessoas. Por que sua obra fala de gente, fala de sentimentos de realidades, sonhos e da existência humana como ela é; Pura, simples, delicada e extremamente envolvente.
Encanta-me muito um dos seus filme que se chama A Espera ( 2002), dirigido, produzido e com atuação dela própria. Este filme , foi todo rodado na serra Gaúcha, e com a trilha sonora de uma Compositora e Interprete do Nordeste do Brasil ( Paraíba) que se chama Socorro Lyra, um mix raro que deu muito certo. Teve, naturalmente, a sensibilidade de Vera para fazer esta junção em tempo e espaço adequado. Como o filme fala de gente que espera algo, isto se torna atemporal e sem localização geográfica. Pois a espera esta no coração. Basta estar vivo em qualquer lugar do planeta para entender e sentir o filme. A serra gaúcha embalada por um tom e melodia do sertão. Um primor, que quando termina, ficamos na espera de mais. Há cenas que marcam pela sensibilidade e da dureza das personagens por longos anos de espera. Esta espera foi incorporada no cotidiano, na vida esquecida e em um lugar bucólico, que por vezes aperta o coração e denuncia nossas saudades e desejo de rever alguém. Seus rostos e gestos, são quase automatizados, embrutecidos pelo escárnio do tempo. Seguem um ritual repetitivo, de acordar, tomar chimarrão, ir a roça, que por vezes sofrem a intervenção de resquícios de sonhos e desejos, que invadem as cenas tingindo de uma cor improvável o verde da serra. As personagens, há muito não choram mais. As lágrimas secaram. Mas Vera, traz o choro e as lágrimas através de um chuva torrencial que escorre pelas velhas telhas da casa; Como as velhas faces surradas, duras e quase fria das personagens. É água que escorre, que lava , inunda , que leva e traz inúmeros conteúdos que são captados de relance pela lente sensível e sabia da diretora. No fundo o fogo de chão que continua alimentar a espera enquanto o coração das duas irmãs continuam em um lamento silencioso e cronificado, esperando por alguém que deve chegar. Cenas como esta e outras tornam o filme uma poesia intimista com ícones reconhecidos por todos. Em sua lente, vê-se citações propositadas ou não de Buñel, Feline e Bergman com delicadeza e sutileza de quem tem talento para tal.
Vera da Luz, dirigiu , atuou, roteirizou inúmeros trabalhos e já foi premiada em amostras de vídeo em Porto Alegre, alguns trabalhos já rodam o mundo, suas interpretações na musica já fazem escala no Japão, mas aqui pouco sabemos de sua obra. Eu tenho o privilegio de ter acesso a obra de Vera, e gostaria muito que maior numero de pessoas pudessem ter acesso .Espero e aposto que logo veremos o cinema de Vera . E que a Vera não perca jamais esta paixão que é o cinema. E quem conhece a Vera, sabe que isto esta em todos seus poros. Vera sou teu fã. Espero ainda ver muitas de seus filmes, e que sei são inúmeros projetos esperando apoio e investidores.

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